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"Sometimes meaningless gestures are all we have"

segunda-feira, julho 27, 2009
Inimigos Públicos (Public Enemies)



Rascunhos após ver o filme. Mais apenas após revisão.

Michael Mann indo para a Chicago dos anos 30 e tratando de gangsters não deixa, em nenhum momento, a continuar lidando com conhecimento e informação, essenciais tanto para o seu cinema quanto para os seus personagens.

A força policial que J. Edgar Hoover cria usa de diversos recursos tecnológicos (à época) para a caça à Dillinger: laboratório forense, escutas telefônicas, noticiários cinematográficos (e a mídia como um todo), comunicações entre policiais de diferentes jurisdições, etcs. E do outro lado Dillinger e sua gangue também estão à frente dos outros com suas táticas de roubos interestaduais, seu armamento pesado e moderno, sua rede de contatos (mas logo serão ultrapassados pela tecnologia não só da polícia, mas de outros criminosos).

Os dois antagonistas são extremamente profissionais, mas vão, por causa das circunstâncias, se perder em algum ponto, fazendo com que ambos, de certa forma, fracassem: Dillinger cai numa emboscada e Purvis quase impotente vê seu oponente ser derrotado, não da forma que desejava. O policial que tortura Billie, por exemplo, é extremamente anti-profissional, e é humilhado duas vezes, pela própria Billie e por Dillinger ao final (e pelo próprio Mann no final das contas).

Surge na figura do agente Winstead o ideal de Mann: extremamente competente, que antevê como seu rival pensa e age, bem alinhado e que mantém grande ética até o final quando reconhece a importância do recado de Dillinger para a amada. Só que nunca é exatamente nesse ideal que ele realmente se interessa já que a tragicidade dos que conseguem (ou não) se manterem profissionais é que move a linha dramática da maioria de seus filmes. Relações familiares e amorosas são postas em cheque ou simplesmente inexistem, o fim dos sonhos ou desejos e, por fim a própria vida podem ser dispostas à mesa como ofertas diante do que o trabalho exige. O tom trágico é uma constante mesmo que em pequenas doses.

Winstead fecha o filme na forma como grandes protagonistas, principalmente no cinema de Mann, se despedem: de costas para o público, o deixando, e muitas vezes ficando livres fora do olhar deste público e também deixando o público livre para pensar o que aquele rosto que não se vê está expressando.

A mulher sempre representa uma opção de saída daquele mundo pois é quase de um outro universo (Gong Li em Miami Vice, Jada Pinkett Smith em Colateral, Amy Brenneman em Fogo Contra Fogo, Madeleine Stowe em O Último Dos Moicanos, Joan Allen em O Caçador De Assassinos, etcs) e é na figura feminina que o romantismo de Mann se mostra mais forte do que a superfície demonstra. Em Inimigos Públicos a cena mais romântica se dá entre o protagonista e a tela de cinema quando a atriz do filme que vê o faz lembrar de sua amada.

O John Dillinger de Mann se aproxima muito de Carlito Brigante, ainda mais na categorização deles como quase fantasmas desse mundo (Dillinger em pelo menos três situações passa flagrantemente desapercebido do mundo ao redor) que se reencontram apenas na ilusão (Dillinger no filme que vê, Brigante no comercial paradisíaco da estação). Um deles foi real, mas quem exatamente não é tão óbvio quanto se possa pensar.

Dillinger e seu reencontro consigo mesmo, que fica mais evidente no cinema, tem, logo antes, seu momento máximo ao visitar uma delegacia e ver todas as anotações sobre o seu caso. É ali, nas anotações, nas fotos, nas gravações, nos recortes de jornais que ele se completa, num misto de saudosismo (ao perceber todos os companheiros rotulados como mortos) e realização (o que ele é, o que ele foi e realizou).



Mann vai ficando cada vez mais livre, tanto na técnica quanto na narrativa, mesmo que com isso não seja tão bem aceito ou compreendido quanto antes. O cinema agradece.

“No one here can love or understand me,

oh, what hard luck stories they all hand me.
Make my bed and light the light,
I'll be home late tonight.
Blackbird bye bye.”


posted by RENATO DOHO 3:40 PM
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