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"Sometimes meaningless gestures are all we have"

quinta-feira, junho 30, 2005
Guerra Dos Mundos (War Of The Worlds)



Impressionante como eu sempre acho que Spielberg vai fazer uma coisa e faz outra. A questão do olhar me surpreendeu pois era algo que não esperava (não tanto assim, já que as cenas e o trailer apontavam para isso). Preciso até rever para apreciar mais esse lado. O que cada personagem vê ou deixa de ver é interessantíssimo. A garotinha (Dakota Fanning, extraordinária) assume boa parte da visão do filme, seja no chamado para ver algo no quintal, no que ela não vê o que o pai viu, no que ela mostra para ser visto (um fiapo na mão), no que ela não quer que seja visto (ela indo fazer xixi), nos corpos do rio, no que ela não pode ver (a destruição fora da casa da mãe), o que ela presencia de mudança ao que passa pelos seus olhos da janela do carro (enquanto o pai dorme) e se defrontando com as pessoas os cercando (com o tiro "right between the eyes" no parabrisa), acabando não vendo o que acontece com o homem que pega o carro, nas árvores que estão estranhas (antevendo o ataque), na noção de mortalidade pelo que não vê (na escuridão ela pergunta: "estamos mortos?"), no que o pai faz com o paranóico, o alien que olha para ela (e ela se olhando no "olho" dele), no olhar em choque quando pega pelos invasores, enfim... muitos etcs.



E ainda temos dezenas de outros momentos assim (a câmera no chão presenciando a primeira morte, o alien se olhando no espelho ou olhando fotos, os reflexos de tvs, espelhos, retrovisores, a fita da repórter, o fascínio do filho em ver o que o exército fará, o casal que viu a garota sozinha e não viu o pai, os olhos do alien secando demonstrando sua morte). Chegando até o final (ou o início) no que não é visível para nós (e talvez para os aliens) que causa a derrocada dos "vilões".

Há uma mistura curiosa no que Spielberg já abordava em filmes anteriores sobre esse tema (o mais óbvio é Minority Report) e no que David Koepp também trabalhava (no roteiro de Olhos De Serpente, por exemplo ou na direção de A Janela Secreta).

A questão da pulverização dos humanos à primeira vista parece uma amenização, mas assume um lado bem mais aterrador. Primeiro o simples fato de uma pessoa deixar de existir assim, num piscar de olhos, virar pó. E depois o ótimo paralelo com as cinzas. Qual a evidência da morte de centenas de pessoas cremadas nos fornos dos campos de concentração nazistas? Cinzas (em A Lista De Schindler há uma cena sobre isso).

A reversão das coisas no filme é outro aspecto curioso, a construção narrativa parece ao contrário, clímax logo no início para um final anti clímax (o primeiro pensamento logo ao notar a volta da narração ao final: "ué, mas acabou?"). Os aliens vindo de dentro e não de fora. A angústia e tensão colocados no início (os aliens mostrados logo de cara, quando o normal seria deixá-los ocultos para a revelação final) quando mal conhecemos os personagens são fortes e emocionais (o desespero no carro, com a câmera entrando e saindo do veículo, me deixou extremamente perturbado, com medo mesmo da perda da noção de realidade). Mais coisas surreais acontecem, deixando um clima de terror no ar (o trem em chamas é fascinante, a multidão em desespero é apavorante pelas atitudes, como um dos homens querendo abrir à mão o buraco no vidro do carro, o que lembra Tom Cruise em outra fenda, a dos aliens, como um parto).

Para se pensar na sobrevivência do filho, se era necessária ou não. Creio que vai ser alvo de muitas críticas (como muitos finais do Spielberg). Eu sabia que ele estava vivo, mas acho que não é isso o que a maioria vai achar.



posted by RENATO DOHO 12:09 AM
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