Querido Estranho Segunda passada ou retrasada, sem querer, deixei gravando o programa do Jô mais do que o necessário e acabou gravando parte desse filme na sessão nacional. Vi o comecinho de curiosidade e acabei gostando, mas como a gravação não estava completa quis alugar o filme para terminar de ver. O que mais chamou minha atenção foi que a dramaturgia do filme era muito parecida com o estilo americano, mais do que o brasileiro, mesmo que o filme seja baseado numa peça da Maria Adelaide Amaral. Algo de Miller, O'Neill, Albee, Williams, claro que de forma simplificada, mas diferente de como geralmente se constrói a exposição de personagens e cenas na dramaturgia teatral brasileira. O projeto, modesto, sem querer ser mais do que é, sem grandes lances por parte da direção, me conquistou pelo elenco afiado, a redescoberta de Daniel Filho como ator (ótima interpretação, talvez uma de suas melhores performances) - que curiosamente acabei vendo partes de sua atuação em Romance Da Empregada que passou no Canal Brasil recentemente - com um personagem fascinante, cheio de humor e amargura, e a bela descoberta da atriz Cláudia Netto que faz a filha caçula. Além disso foi legal rever Ana Beatriz Nogueira, que sempre me deu a impressão que sumiu depois de Vera, ou melhor dizendo, nunca estourou como era de se esperar após toda atenção que recebeu devido à esse trabalho. Hoje em dia ela me lembra a cantora Ana Carolina. A situação, muito teatral, de fazer de uma festa de família uma razão para que verdades surjam e conflitos se estabeleçam não deixa que o filme fique realmente parecendo um teatro filmado, pois alguns bons momentos só são alcançados pela imagem e pela proximidade que é mais difícil ser alcançada em cima de um palco.Outra coisa que gostei foi que o universo retratado, apesar de ser perfeitamente transposto para outra realidade (país), tem elementos bem familiares e, por que não dizer, nacionais. De todos os personagens podemos nos lembrar de alguém que conhecemos, histórias de vida parecidas, comportamentos idênticos e peculiariedades comuns (como acender vela para São Judas Tadeu ou ir comprar refrigerante em bar ou a filha solteirona que sustenta a casa). Eu mesmo achei que o personagem de Daniel lembrava muito duas pessoas que conheço, com a cultura, o humor peculiar, a língua afiada e o gosto pela bebida.Invertendo a abordagem a história difere do imaginário americano que a dramaturgia faz lembrar ao fazer com que o protagonista se ligue mais em erudição, cultura, arte e despreze a ambição monetária enquanto que num texto americano o que é mais atacado é a obsessão pelo dinheiro que move personagens, geralmente frustrados diante dessas ambições (como em A Morte Do Caixeiro Viajante). Por exemplo, o filho é acusado de ter uma vida pequena por ter escolhido o caminho do dinheiro, enquanto que isso seria mostrado como algo vitorioso para americanos e lá sim, quem ambiciona por algo artístico é mostrado como fracassado (os poetas desconhecidos, os escritores sem livros publicados...). Mas ambos os tratamentos trabalham com o mesmo tema das vidas que nunca realmente se realizam.Vendo as entrevistas do dvd a maior surpresa foi ver que a única que difere do que se mostra na tela é a Cláudia Netto, que parece ter um passado cômico e de musicais.O filme é uma bela surpresa e para quem curte esse tipo de dramaturgia apreciará bastante. posted by RENATO DOHO 8:18 PM . . . Comments: